29/05/2020

MICÇÃO


Ela nunca tinha visto um homem mijando. Nem irmão nem pai nem primo nem ex-namorado; nem em revista nem no cinema nem na internet. Nunca, ele soube mais tarde. Então começou a entender por que, nas primeiras vezes em que saía da cama para ir ao banheiro após o sexo, ela ficava espionando pela fresta da porta, em silêncio, olhos brilhantes, fixos nos jatos amarelados que jorravam de seu pau lambuzado para a cerâmica branquinha.

No começo, ele achava estranho, ficava encabulado, às vezes nem conseguia mijar, mas fazia de conta que não percebia. Depois de um tempo, passou a deixar a porta escancarada. Ela ficava encostada no umbral, nua, descalça, observando todos os seus movimentos.

Aquela vigilância durante a madrugada, às vezes pela manhã, provocava nele um tesão improvável: partia mijando de pinto murcho e terminava em riste, respingando pelas paredes. Ela ria, e também se excitava com a comédia.

Quando ia para o banheiro, sabia que ela viria junto. Quando não vinha, ele esperava pacientemente, de pé, tampa do bacio levantada, bexiga cheia, aguardando seu tiro de largada com o olhar.

No segundo mês, ela passou a ficar mais perto, com a bunda apoiada no granito da pia, braços cruzados. Eventualmente se encaixava atrás dele, segurava seu pau e, na ponta dos pés, olhando por cima dos ombros, mirava com precisão até acertar na água da privada. Ele teve de ensiná-la que é melhor apontar para as laterais do vaso e deixar o líquido escorrer, senão, além do barulho e da espuma, acabam voando algumas gotas para o chão.

O ritual se repetia diariamente, quase sem palavras. Então voltavam para a cama ou iniciavam uma nova sessão ali mesmo, ela com as mãos espalmadas no azulejo, pernas afastadas, buceta encharcada como ele nunca vira igual. Nunca, ele soube mais tarde.

Até que se separaram, tão rápido quanto um jato de urina. Incompatibilidade fora da cama, divergências políticas ou religiosas, ninguém soube listar exatamente os motivos. Ela deixou de segui-lo ao banheiro, depois deixou de atender seus telefonemas, depois sumiu de sua vida. Não totalmente, na verdade. Ainda hoje, sempre que precisa mijar, ele sente seu olhar curioso por trás da porta entreaberta.

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